Cerca de 70 instituições ambientalistas, entre elas SOS Mata Atlântica, Rede Pró-UC, SPVS e SOS Pantanal, assinam manifesto que será entregue à direção do ICMBio e à ministra Marina Silva

No documento intitulado Manifesto em Defesa do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), outros 48 signatários demonstram insatisfação com a falta de comprometimento do órgão federal na garantia da proteção de Unidades de Conservação de Proteção Integral, como os 74 parques nacionais do Brasil  

Nesta quinta-feira (27.3), representantes de 68 entidades de preservação ambiental como SOS Mata Atlântica, SOS Pantanal, Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem (SPVS), Rede Nacional Pró-Unidades de Conservação (Rede Pró-UC), Associação Onçafari e Instituto Arara-Azul, entre outras, entregaram à Marina Silva, Ministra de Estado do Meio Ambiente e Mudança do Clima do Brasil, e à direção do ICMBio, o Manifesto em Defesa do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC).

 

O documento, que também conta com a assinatura de 48 personalidades da sociedade civil engajadas com iniciativas de defesa socioambiental, expressa preocupação com decisões recentes do Governo Federal que têm enfraquecido a preservação das Unidades de Conservação de Proteção Integral (UCs) a partir da emissão de termos que permitem o uso das UCs para fins pessoais, contrariando a Constituição Federal e prerrogativas do próprio SNUC.

 

Citando como exemplo a tentativa recente de acomodar um número indeterminado de famílias de comunidades indígenas em uma área de 6,7 mil hectares da Reserva Biológica Bom Jesus, no Paraná, o manifesto dá ênfase às políticas públicas conjuntamente promovidas pelo ICMBio e a FUNAI, com destaque para o potencial nocivo decorrente da ocupação de territórios de conservação e a permissividade de atividades incompatíveis com a preservação, como a caça de espécies ameaçadas.

 

Ressaltando apoio total às causas dos povos originários e reiterando a necessidade de implementações de UCs e TIs, os signatários defendem que propostas com as que são alvo do manifesto, ineptas pela sobreposição de interesses, além de não atender aos propósitos de proteção integral das UCs e TIs, não contribuem para o pleno domínio de comunidades indígenas em áreas especialmente delimitadas para esta finalidade.

 

Para o ex-deputado federal constituinte e ambientalista Fabio Feldmann, signatário do manifesto e um dos criadores da Lei da Mata Atlântica e do decreto que sancionou a existência do SNUC, áreas preservadas, como UCs e TIs, podem ter seus atributos gravemente comprometidos com a implementação de atividades econômicas desprovidas de estudos que possibilitem o fomento de iniciativas sustentáveis.

 

“A Constituição Federal trata Área Protegidas, de uso restrito ou comunitários, assim como Terras Indígenas, como categorias distintas. E é com muita preocupação que vejo as práticas em curso no ICMBio, que não está respeitando o texto constitucional brasileiro. Quando tratamos de áreas de proteção ambiental, principalmente as de proteção integral, atividades que podem comprometer seus atributos devem ser vistas com muito cuidado”, adverte Feldmann.

 

Entre as principais reivindicações destacadas no manifesto, o documento defende a preservação rigorosa das Unidades de Conservação, com a exigência de que o Governo Federal respeite os objetivos das UCs de Proteção Integral, sem abrir precedentes para sua ocupação ou exploração. O documento destaca, ainda, a necessidade de separação das funções entre ICMBio e FUNAI e denuncia flexibilizações que ameaçam espécies protegidas e comprometem a integridade das áreas de conservação.

 

Leia a íntegra do manifesto:

 

Manifesto em Defesa do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC)

 

27 de março de 2025

 

As instituições e pessoas físicas abaixo vêm a público demonstrar sua contrariedade e grande preocupação em relação a iniciativas promovidas por instâncias do Governo Federal que fragilizam a devida proteção de UCs de Proteção Integral e o direito constitucional a um meio ambiente íntegro.

 

Não são compreensíveis movimentos que, de formas desconexa e contraditória com compromissos estabelecidos e do próprio respeito à Constituição Brasileira e ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação, coloquem em risco as poucas Unidades de Conservação de Proteção Integral em biomas já extremamente pressionados por continuados processos de degradação e crônica falta de pessoal e recursos.

 

Casos como a tentativa recente de inclusão no interior da Reserva Biológica Bom Jesus, no Paraná, promovida pelo ICMBIO e pela FUNAI, numa área delimitada de cerca de 6,7 mil hectares e para acomodar famílias de comunidades indígenas, sem um limite, o que inclui práticas de caça de espécies ameaçadas de extinção dentre outras atividades incompatíveis com a categorização desta UC, representam não apenas uma abertura perigosa de precedentes como uma demonstração de pouca aderência do Governo Federal com o compromisso de proteger e de garantir o incremento da gestão de nossas UCs, cada qual dentro de suas atribuições.

 

Em resposta aos questionamentos feitos¹, o ICMBio usa um “jogo de palavras” para dizer que há um limite e para minimizar a questão da caça. É afirmado que “Novas admissões dentro da comunidade deverão seguir critérios internos dos Guarani Mbya e serem avaliadas pela Comissão de Acompanhamento instituída pelo TC”. Isso significa, sim, que todo aquele admitido pela Comunidade poderá ingressar na Reserva, sem limite. A FUNAI já deixou claro que as Unidades de Conservação Federais de Proteção Integral devem servir aos indígenas.

 

Quanto à caça, o ICMBio afirma: “O TC estabelece regras para a caça” e que “não há indícios de impacto ambiental significativo na fauna da Rebio desde a ocupação indígena”. Ora, estamos a tratar de espécies ameaçadas de extinção, essa discussão de “impacto” nem deveria ser aventada por um órgão que deveria proteger as UCs. O fato de ser vulnerável e ameaçada de extinção é pressuposto, por si só, para concluir que um único indivíduo caçado já impacta o pouco quantitativo de espécies. Então, o ICMBio inverteu sua lógica, desprotegendo a fauna das UCs para favorecer uma “condição imprópria para a manutenção da cultura e subsistência indígena”, sem, ao final, criarem novas TIs e nem mesmo ampliarem as áreas conservadas.

 

Soma-se a esse exemplo, o caso do Parque Nacional Iguaçu quando, recentemente, esta mesma premissa foi alentada. Também merecem atenção acordos tratando de UCs de Uso Sustentável, especialmente frente a possibilidades de autorização de caça de animais silvestres em seus territórios, como aventado em casos como o das Florestas Nacionais de Canela e de São Francisco de Paula, no Rio Grande do Sul.

 

Cabe ressaltar nosso total apoio à busca de áreas adequadas e necessárias para a consolidação e a criação de novas Terras Indígenas em todo o território nacional. No entanto, propostas de sobreposição representam tão somente um serviço imperfeito, que não atende aos propósitos nem das UCs de Proteção Integral nem do pleno domínio de comunidades indígenas em áreas especialmente delimitadas para esta finalidade. ICMBio e FUNAI têm missões distintas. UCs e TIs têm finalidades distintas. Esta prerrogativa, a despeito de interfaces existentes, não pode ser alterada de maneira a criar desvios de finalidade destas instituições e/ou de quem as está gerindo no momento.

 

Respeitosamente,

 

Instituições:

 

Agencia de Sustentabilidade Mãozinha Verde – Bettina Zullig Pensera

Associação de Preservação do meio Ambiente e Vida – Miriam Prochnow

Associação Ambientalista Copaíba – Camila Conti

Associação dos Atrativos de Bonito e Região – Eduardo Coelho

Associação Catarinense de Preservação da Natureza – Lauro Eduardo Bacca

Associação em Defesa do Rio Paraná, Afluentes e Mata Ciliar – APOENA – Djalma Weffort

Associação Mico-Leão-Dourado – Luiz Paulo Ferraz

Associação Mineira de Defesa do Meio Ambiente – Maria Dalce Ricas

Associação Onçafari – Marina Courrol

Associação MarBrasil – Juliano Dobis

Avinc – Cayo Alcântara

Bioflora – Tecnologia da Restauração – Ricardo Ribeiro Rodrigues

Centro de Estudos, Defesa e Educação Ambiental – CEDEA – Laura Jesus de Moura Costa

Confederação Nacional de RPPNs – Marco Antônio de Resende Ferreira

Divers for Sharks – Mergulhadores em Defesa do Tubarões – Paulo Cavalcanti

Forum Brasileiro da Família Empresária – Nelson Cury Filho

Fundação Brasil Cidadão – Bosco Carbogim

Fundação Ecotrópica – Ilvanio Martins

Fundação Museu Americano FUMHAM – Márcia Chame

Fundação Neotrópica do Brasil – Cheung Kwok Chiu

Fundação Pró-Natureza – FUNATURA

Fundação SOS Mata Atlântica

Fundação ZooFoz – Eduardo Foz

Grupo Ação Ecológica – André Ilha

Grupo Pau-Campeche – João de Deus Medeiros

IASB – Eduardo Coelho

Igré – Associação Socioambientalista – Carla Fontana

Instituto Amigos da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica – Ana Maria Lopez Espinha

Instituto Ampara Animal – Juliana Camargo

Instituto Arara-Azul – Neiva Guedes

Instituto Atmosfera2 – Gilmar de Lima

Instituto Brasileiro de Conservação da Natureza – José Truda Palazzo Jr.

Instituto Curicaca – Alexandre Krob

Instituto de Conservação de Animais Silvestres – Arnaud Desbiez

Instituto de Estudos Ambientais Mater Natura – Paulo Aparecido Pizzi

Instituto Floresta Viva – Rui Barbosa da Rocha

Instituto Homem Pantaneiro – Cel. Ângelo Rabelo

Instituto Horus – Silvia Ziller

Instituto Legado – James Marins

Instituto Líbio – Raquel Machado

Instituto Mira-Serra – Lisiane Becker

Instituto Onça-Pintada – Leandro Silveira

Instituto Onças do Rio Negro – Lucas Leuzinger

Instituto de Pesquisa Cananéia – Roberto Fusco

Instituto de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental – Clóvis Borges

Instituto Pouso Alto – Flávia Cantal

Instituto Projeto Ariranhas – Caroline Leuchtenberger

Instituto Purunã – Soraia Melchioretto

Instituto Rã-Bugio para a Conservação da Biodiversidade – Elza Nishimura Woehl

Instituto Reprocon – Gedielson Ribeiro de Araújo

Instituto SOS Pantanal – Alexandre Bossi

Instituto Taquari Vivo – Renato Roscoe

Observatório Justiça e Conservação – Giem Guimarães

Partido Verde do Paraná – Raphael Rolim de Moura

Panthera – Leonardo Avelino

Rede Ambiental Piauí – Tânia Maria Martins Santos

Rede Brasileira de Reservas Naturais – RPPNs – Laércio M. de Souza

Rede Pro-UCs – Angela Kuczach

Refúgio Bem Viver – Felipe Coutinho Batista Esteves

RPPN Avá-Canoeiro – Flávia Cantal

RPPN Ernesto Vargas Baptista

RPPN Renascer – Uta Bodewig

Sauá Consultoria Ambiental – Carolina Martins Garcia

SAVE Brasil – Sociedade para a Conservação das Aves do Brasil – Pedro Develey

Sociadade Chauá – André C. F. Sampaio

Taoway – Sustentabilidade Socioambiental

União Petritense de Proteção ao Ambiente Natural – Dionil Machado Pereira

União Protetora do Meio Ambiente – UPAN – Rafael José Altenhofen

 

 

Pessoas físicas:

 

Alain Belda

Ana Luiza de Almeida Batista Martins Abrão

Betina Ortiz Bruel

Carla Berl

Carlos Manoel Amaral Soares

Cláudia Gaigher

Daniel Shinohara

Deborah Fanhoni

Dirceu Schmidlin

Fábio Feldmann

Fábio Olmos

Fernanda Delborgo Abra

Fernando Fernandez

Gabriel Caram

Guto Quintella

Irlau Machado

Italo Ferreira

Ivan Baptiston

Juliana Werdesheim Altona

Joana Picp

João Siqueira

José Pedro de Oliveira Costa

Júlio Dalponte

Lélia Doumit

Marc Dourojeanni

Marcelo Augusto Santana de Melo

Marcos Swarowsky

Maria Tereza Jorge Pádua

Mário Haberfeld

Mário Mantovani

Mariana Monteiro de Souza Bastos

Maristela Temer

Marta Calasans Gomes

Martins Abraão

Mônica Guimaráes Pinheiro de Moraes

Morris Safdie

Nina Valentini

Paulo Artagão

Pedro Camargo

Pedro Lara

Renata Soares

Renato Rondon

Rinaldo Cesar Zangirolami

Roberta Paes de Almeida de Mello Souza

Robert Betenson

Robert Kozmann

Roberto Klabin

Ricardo Miranda de Britez

 

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